Som e fúria

Vivemos num mundo de muitas vozes. Muita informação. Muito barulho por nada. Tempestades em copo d'água. Uma verborragia desenfreada. Parece que precisamos falar e ouvir o tempo todo. Ouvir a última do vizinho. As notícias do dia. Ouvir as sirenes, buzinas, o lamento do vencido, a comemoração do vencedor. A TV ligada por hábito. Ouvir e não calar. Falar sobre si. Sobre os outros. Sobre a última tragédia. Sobre o jogo de futebol. Sobre a previsão do tempo.

Parece até que o silêncio é pecado.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

E não me venham com ecletismos



“Sou eclético”. Quantas vezes você já escutou isso ao indagar alguém sobre as suas preferências? Que tipo de música gosta? Estilo de filme? Livros? Parece que a ordem do dia é gostar de tudo ao mesmo tempo, sem restrições.

Sou do tempo em que era preciso fazer certas opções: ou uma coisa, ou outra. Não dava para gostar de pagode e punk rock ao mesmo tempo, simplesmente porque, além de ritmos completamente diferentes, estava em jogo uma filosofia musical implícita, que aparentemente permeava seus ouvintes e admiradores. Dizer que era pagodeiro, rockeiro, metaleiro ou punk carregava uma gama de identidades paralelas, assumidas com gosto por aqueles que consumiam não apenas a música e as sensações que ela carrega. Era uma escolha pessoal que, como a maioria das escolhas, exigia discernimento e, porque não, coragem.

O ecletismo que impera em nosso tempo é simplesmente a solução mais fácil e confortável de assumir todas as identidades possíveis, participar de todos os grupos, ser aceito em todas as tribos, não excluir nada e nem ninguém de seu caminho que, assim como o dia de amanhã, é incerto. Gostar de tudo é se manter no jogo, independente de quem for jogar ou de onde ele vá se realizar. É assumir o papel mais fácil e óbvio.

O meu sociólogo preferido, o Bauman, diz que ter uma identidade fixa é algo cada vez mais mal visto. As identidades não são mais construídas para durar eternamente, elas vão se moldando, se desfazendo e refazendo, como se fossem um atributo momentâneo. Ou seja, posso ser aquilo que você quiser, aquilo que for mais conveniente no momento, aquilo que mais agradar.

Assim, gostar de Ivete Sangalo, Calipso, NX Zero, Joss Stone ou Amy Winehouse significa “ser eclético”. Gostar de ouvir funk e sertanejo “universitário” ou ler Lua Nova, Crepúsculo ou Código Da Vinci significam apenas ouvir e ler o que “todo mundo” está ouvindo e lendo, e por isso, plenamente justificável. Tem que gostar, porque toca em todos os lugares. Tem que ler, para ter assunto com aqueles que já leram ou ainda lerão.

Uma questão de escolha? Ou questão de fazer a escolha que o mercado quer que você faça? Bons tempos aqueles em que a música, a literatura, o cinema – as artes, enfim – eram mais do que produtos nas prateleiras. E que as pessoas tinham uma coisa que anda esquecida e em desuso: personalidade. Mas isso já é outra história...