
Sala de pesquisa. Silêncio total. Adentra no ambiente uma colega do semestre passado que eu só descobri existir quando me adicionou no Orkut, há mais ou menos dois meses. Eu nunca tinha conversado com ela nem percebido sua presença nas aulas, por isso demorei um pouco para ligar o nome e foto à pessoa. Mas, quando vi nos amigos em comum vários colegas da Feevale, acabei aceitando o pedido de “amizade virtual”.
Essa mesma menina entra na sala e não me dá oi. Sequer olha para minha cara. Está com fones nos ouvidos e a música é tão alta que posso ouvi-la nitidamente. Senta em frente ao computador, enterra os olhos na tela e não menciona sequer uma palavra nas quase duas horas que permanece sentada na cadeira a menos de um metro de distância da minha. Depois, levanta e vai embora. Nem tchau. “Um bom dia para você também, amiga virtual”, penso eu nos meus devaneios.
Fiquei absurdamente incomodada com este episódio, imaginando cá com os meus botões em que espécie de mundo estamos vivendo e, principalmente, que espécie de relações interpessoais estamos construindo. A pessoa estuda com você mas, em todos os dias de convivência dentro da mesma sala de aula não se manifesta. Daí um belo dia ela veste sua roupa virtual e decide procurar você no Orkut e, mais do que isso, adicionar você como amigo. Depois disso a pessoa real – aquela correspondente a persona virtual que te adicionou – continua não se manifestando, como se não lhe conhecesse.
Juro que não entendi. Por que cargas d’água essa pessoa me quer na sua lista de amigos se finge não me conhecer quando me vê?
Já ouvi uma pesquisadora de cibercultura dizer – e concordei piamente – que muitos de nós hoje vivem em prol de alimentar nossa persona virtual. Tudo que fazemos deve ser divertido e único e, claro, devidamente registrado com fotos. Você já fotografa os momentos pensando em publicá-los no Orkut depois. Antes, fotografava-se para registrar um momento especial. Hoje, fotografa-se para que este momento pareça especial aos olhos dos outros – mesmo que ele de fato não seja tão especial assim. Quem nunca ouviu a frase infame que diz: “Essa é pro Orkut!” antes do clique?
Ao que parece estamos nos tornando simulacros de nossa própria realidade. Eu, a Pâmela do “mundo real”, posso levar uma vida medíocre e solitária, a ponto de me considerar auto-suficiente o bastante para não precisar me comunicar o mínimo possível com as pessoas ao meu redor. Em contrapartida, a Pâmela virtual – bem mais bonita, comunicativa e cheia de amigos – é quem definitivamente socializa e convive com os demais ícones e janelinhas piscantes do maravilhoso mundo da web.
Ficar triste? Jamais! As pessoas virtuais não sofrem. Tudo superam, tudo podem. Nunca são passadas para trás. Sempre se divertem nos finais de semana. Nunca estão de mau humor. São adoradas pelos amigos. Não tem problemas de qualquer ordem ou espécie. Escolher viver a persona real, como se vê, é para os corajosos. Uma amizade de verdade pode ser perigosa, cheia de sensações, dores, sabores e alegrias. Coisas triviais que só se vive quando deixa o mouse de lado. E nem precisa de internet banda larga para começar.